Tuesday, November 3, 2009

A cidade e o caos

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A moldura preta da janela fez da cidade ao fundo um quadro
de formas duras com cores sólidas e opacas
como se abstraindo do mundo apenas o caos
a fúria obliqua em suas quinas e sombras

Numa tarde, meus olhos tatearam o plano da janela
como se a cidade fosse plana naquela pintura
como se tudo se achatasse em uma só camada
como se o acidente de cores e quinas fosse acaso pintado

Quem pintaria tal caos se não meus olhos atrás do vidro?
Meus olhos imóveis que alcançam a distancia além do vidro
viram no vidro a cidade e a cidade pintada no vidro

Minha mente que recebia a visão já não a conhecia como antes
pintava um quadro como se fosse caos
entendia a imagem como se o vidro fosse espelho.


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Isaque Veríssimo

Aniversário

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“Tic-tac-tic-tac” Molas, pêndulos e a fantástica noção do tempo além de sombras e sois.
A cronologia que inventamos parece que se voltou contra nós, tentamos domar o tempo que era livre, que selvagem corria pelos cantos e se escondia atrás de sorrisos, que nos libertava de compreendê-lo e que por fim, nos domou como resposta.
Hoje vivemos em função dele. O sol nascente e o poente que anunciavam o começo e o fim do dia, hoje são cinco e meia da manhã e seis da tarde. Hoje é o “bip-bip” do despertador e a sirene de saída...

...Dez pra seis, meia noite e meia, vinte e cinco anos, vinte quatro primaveras, meia vida contada, um quarto de século e uma história. Uma fração sentida e percebida de uma era.
O tempo que tanto confundiu sábios e inspirou poetas, hoje aflige que se da conta dele.

E se nunca tivéssemos matematisado o tempo?, se nossa cronologia jamais tivesse existido e a conta das primaveras que vivemos fosse descontada por distração?
Que idade teríamos? Como uma geração que cresse sem perceber que envelhece, sem ver fotos, apenas se dando conta das novas dimensões e situações. Se talvez nunca houvéssemos tentado domar o tempo, ele não se mostraria e nem nos afligiria. Nem seria sexta feira, nem seria dezembro de dois mil e tantas e nem perceberíamos a areia por entre os dedos correr tão depressa.

A sensação é que o “tic-tac” do relógio alimenta o monstro debaixo da cama que cresse forte no passo que crêssemos. E não a tempo de encarar, nem há tempo de fugir.

O senhor da razão, o melhor remédio, o vilão assassino de sonhos, o anel precioso perdido na estrada, as marcas nas pedras, as voltas em volta do sol e volta completa do ponteiro menor. O tempo que passa, passa, e sempre vai passar, cronometrem os relógios ou não, disfarcem os sorrisos ou não, nos cabe passar com ele no passo da vida.

Do mais, tudo passa.


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Isaque Veríssimo