Tuesday, January 11, 2011

Solidão, cachaça e gengibre




O gengibre engarrafado curte na cachaça tanto quanto a cachaça curte o gengibre.
Um é o contexto etílico, liquido, engarrafado em si mesmo e concentrado tanto quanto pode. Ardido a não poder ser mais. O outro é o fato isolado, elemento do sabor, o objeto de depuro, signo e significado.

A cachaça entra agressiva gengibre adentro roubando dele sua própria identidade. Se apropria do tal como uma ladra vazia de ser significante, fazendo jus a suas propriedades depurativas.
O gengibre curtindo na cachaça, não só se entrega, se dissolve e irreparavelmente se perde no meio liquido, como também absorve o meio num injusto escambo essencial.


Assim fica a cachaça meio-amarga de gengibre e gengibre meio-ardido de cachaça. Gengibre é gengibre e cachaça é cachaça, até quase não.

Pensar solidão como contexto é equivoco! Solidão não é cachaça...
...solidão é gengibre. É fato isolado. Elemento de dissabor. Objeto puro. Significante.

A solidão é minha, a cachaça sou eu! Tão liquido e concentrado quanto posso, curto meu gengibre depurando dele tudo quanto e onde meu humor ardido avança solidão adentro.
Curto a solidão engarrafada dentro e mim enquanto ela curte em mim absorvendo em si um tanto do que sou.

Assim, ficamos eu meio-amargo de solidão e a solidão meio-ardida de mim. 
Solidão é solidão, eu sou o que sou, até quase não.



Isaque Veríssimo